Resumo do encontro fechado de 15 de março de 2024

Realizada em 15 de março, a reunião marcou o início das atividades do segundo ciclo de estudos. Os coordenadores Daniel Ferraz e Luciana Fonseca estiveram presentes.

Capa do livro
Capa do livro Perspectivas Críticas de Educação Linguística no Brasil (Pá de Palavra, 2018).

No primeiro encontro fechado de 2024, os pesquisadores do GEELLE discutiram as concepções de Educação Linguística e de Formação de Professores presentes no livro Perspectivas Críticas de Educação Linguística no Brasil: Trajetórias e Práticas de Professoras/es Universitárias/os de inglês. O volume, publicado pela editora Pá de Palavra, foi organizado por Rosane Rocha Pessoa, Viviane Pires Viana Silvestre e Walkyria Monte Mór. Abaixo, alguns destaques da reunião.

Fátima Monteiro, em comentário ao texto "Lendo a mim mesma enquanto aprendo com e ensino o outro", de Ana Paula Martinez Duboc, ressaltou que a educação linguística pressupõe o entanglement do docente. Em outras palavras, ela exige do professor um exercício de autoimplicação e autorreflexividade que convida aos questionamentos: O que eu tenho a ver com a história do outro? Em que medida eu corroboro ou luto contra a dor do outro? Sobre a formação docente, Duboc e Monteiro convergem: trata-se do desenvolvimento de repertórios, os quais emergem dos consensos e dissensos entre os diferentes leitores de um texto (cujas leituras dependem de suas respectivas comunidades socioculturais). Sendo assim, os currículos devem ser decoloniais e trazer à tona narrativas de povos subjugados.

Adriano de Alcântara discutiu os apontamentos de Aparecida de Jesus Ferreira no texto "Educação Linguística Crítica e identidades sociais de raça". A autora denuncia a deslegitimação que sofreu de colegas em eventos de Linguística Aplicada e Educação Linguística, como se a área de ensino de línguas não fosse o local de pesquisas sobre identidades sociais de raça/etnia, gênero, classe e orientação sexual. Para Ferreira, esse apagamento está sendo superado, como evidenciam as repercussões dos artigos e livros de que é autora. Alcântara celebra o interesse crescente pelo tema, que exige, nas palavras dele, "um olhar problematizador que não se exaure". Partindo do entendimento de que as categorias de identidade são construídas, em grande medida, pela prática discursiva, a sala de aula de língua emerge como ambiente propício às discussões que estão pulsando na sociedade.

Ana Rivas Gagliardi apresentou a perspectiva transnacional do professor australiano Joel Austin Windle. Influenciado pelas perspectivas educacionais críticas de Paulo Freire e por autores brasileiros como Lynn Mario Trindade de Souza e Denise Braga, Windle estudou a influência da comercialização do ensino de inglês no Brasil. Gagliardi trouxe à tona as ideologias linguísticas associadas a línguas estrangeiras, difundidas amplamente pelos cursos comerciais. Tais ideologias, influenciadas pelo neoimperialismo estadunidense, perpetuam avaliações de competência problemáticas e homogeneizantes, pautadas pela norma linguística do "falante nativo". Visando romper com esse paradigma, o docente compartilha em seu texto uma experiência pedagógica realmente transformadora e atenta às urgências locais. Windle era professor em Mariana (MG) quando a barragem de Fundão, gerida pela mineradora Samarco, rompeu. A calamidade destruiu grande parte do subdistrito de Bento Rodrigues, deixando mortos e desabrigados. Os rejeitos de minérios contaminaram águas fluviais de Minas Gerais e do Espírito Santo, alcançando o Rio Doce. A tragédia-crime afetou diretamente o professor, visto que uma das empresas que controlam a Samarco é a BHP Billiton, sediada em Melbourne. Com o objetivo de gerar pressão internacional sobre a BHP, Windle e seus alunos criaram, em parceria com a Universidade Federal de Ouro Preto (UFOP), a página do Facebook Justice for the victims of BHP and Vale in Brazil. O perfil, que compartilhava informações em inglês sobre a tragédia, atingiu um público amplo tanto no Brasil quanto na Austrália.

Luciana Parnaíba de Castro leu o capítulo “SER CRÍTICA: Uma história (sempre) incompleta”, de Mariana Mastrella-de-Andrade. Instigado pelo texto, o grupo refletiu que a potencialidade de transformação social da escola e dos demais espaços formativos deve ser valorizada. Teoria e prática são indissociáveis: as teorias que não levam em conta as relações e discursos que constituem as posições sociais desiguais e opressoras podem e devem ser questionadas, repensadas e substituídas. Inspirada pela noção de “sujeitos de incompletude”, cunhada por Paulo Freire e mencionada por Mastrella-de-Andrade, Castro refletiu que os professores “começam a ensinar o inglês porque gostam, mas inicialmente sempre parece que falta algo, uma formação mais tradicional”. Esse ensino mais racionalista e prescritivo (como gerenciar a sala de aula, como planejar uma aula, como usar o material didático) é importante, mas não deve – na opinião das pesquisadoras – se sobrepor a uma perspectiva mais relacional, que ajude a entender a escola pública, o contexto onde ensinamos. À vista disso, a professora Mastrella-de-Andrade transferiu suas aulas da disciplina de Estágio Supervisionado para uma sala de aula de escola pública, respondendo à crítica à falta de diálogo entre a universidade e educação básica.

Por fim, Priscila Pereira Carletti fez menção às experiências profissionais compartilhadas por Sávio Siqueira no texto “Por uma educação linguística crítica”. Os dados autobiográficos do professor evidenciam o ensino de inglês que não dá espaço à criticidade, por tratar o inglês como uma commodity, um bem cultural à altura das demandas de alunos-clientes. Carletti recuperou apontamentos de Gagliardi, desvelando o elitismo dessa perspectiva e destacando o papel do professor como ameaça aos poderes constituídos, como defende o linguista Kanavillil Rajagopalan. Para efetivar uma educação verdadeiramente crítica, é necessário que os programas de formação inicial contemplem áreas como Linguística Aplicada, Estudos Culturais, Estudos Identitários e Pedagogia Crítica. Para fundamentar seu texto, Siqueira traz alguns autores pertencentes ao seu arcabouço teórico, como Bala Kumaravadivelu e Walter Mignolo.